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— O poema está então centrado em si mesmo, monstruosamente solitário? Onde estão o corpo e a vida dele e a sua integridade?
— Só é seguro que a pergunta, a procura, o poema reincidente, cristalizam numa grande massa translúcida, um bloco de quartzo. Aquilo do qual nunca te deste conta antes, vais relembrando aos poucos, assim que comeces a ler esse livro, e encontras e descobres... É sabido que comboios completos de pensamento atravessam instantaneamente as nossas cabeças, na forma de certos sentimentos, sem tradução para a linguagem humana, menos ainda para uma linguagem literária...
É uma experiência muito simples que acontece quase diariamente, e ainda para mais quando existe algum outro segredo, uma aflição no coração, para o qual se deseja dar uma expressão verbal, mas que não se consegue. Os dedos sobre o teclado, as letras se reunindo com maior ou menor velocidade, mas com igual indiferença pelo que vão dizendo, enquanto lá fora a vida estoura não só em bombas como também em dádivas de toda natureza, inclusive a simples claridade da hora, vedada a você, que está de olho na maquininha.
Selecionando os retalhos de vida dos outros, para objeto de sua divagação descompromissada. Sereno. Superior. Divino. Sim, como se fosse deus, rei proprietário do universo, que escolhe para o seu jantar de notícias um terremoto, uma revolução, um adultério grego — às vezes nem isso, porque no painel imenso você escolhe só um besouro em campanha para verrumar a madeira. Sim, senhor, que importância a sua: sentado aí, camisa aberta, sandálias, ar condicionado, cafezinho, dando sua opinião sobre a angústia, a revolta, o ridículo, a maluquice dos homens. Esquecido de que é um deles.


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